domingo, 4 de dezembro de 2011

Trato entre iguais

A partir de hoje, nem eu e nem você vamos pensar primeiro em mentir para nos preservar. Não vamos mais seguir o jogo que nos ensinaram, em nome da proteção que não existe. Eu vou te ligar sem que você se sinta invadido, sem que eu me pergunte se sou louca por ter pensado em você num final de tarde. Você vai me ligar quando tiver vontade, sem que eu me censure pelos planos que farei ou pela alegria que me assaltar quando o telefone tocar.

Você não se sentirá covarde ao pensar em mim, nem deixará que seu sentimento seja questionado. Não perderá mais um segundo tentando não ser ou não sentir. Desafiará o senso comum - inclusive o próprio - em nome de sua autenticidade. Assumirá vontades antes que elas virem ilusão ou possibilidade perdida no passado. Conhecerá seus próprios pensamentos para que suas palavras saiam autênticas, sempre. E dessa forma eu jamais duvidarei delas.

Eu deixarei de acreditar em contos de fadas para acreditar na verdade, a verdade pura e cristalina de um ser de carne e osso, com mazelas e defeitos, beleza e grandeza, agruras e feridas, um ser como eu. Que traga consigo o olhar de quem procura um porto para os sonhos. Alguém disposto a tentar, errar e acertar sem colocar nos erros ou idéias de outros a culpa ou glória por seus atos. Alguém capaz de ouvir, escutar e falar o que tem que ser dito. Alguém que não demore para dizer a verdade, e não esqueça que, do outro lado, ela atingirá também um poço de sentimentos comprometidos com a própria realidade.

Façamos um trato: você me contará suas histórias, suas querências passadas, os carinhos que ajudaram a fazer de você um homem. Eu te falarei sobre as paisagens que avistei do mar, sobre os faróis que me guiaram e sobre os momentos em que decidi partir. E ambos consideraremos a escola da vida do outro como o caminho dileto que nos trouxe até aqui, até esse novo porto a que pertencemos.

E quando isso acontecer, decretaremos o fim do jogo, pois não haverá mais jogo para jogar. Tampouco vencedores ou perdedores. Haverá somente duas pessoas, cada uma com sua verdade, misturando claridades.

(04.12.2006)

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Um pouco

Nas caixinhas, botões e ratos
de Drummond
está o pouco que fica:
o perfume
agridoce
da memória.
Os papéis coloridos
a casa em que me torno.
As vidas que tive
e suas dedicatórias.
Os guardanapos perdidos
presilhas quebradas
beijos guardados
e saudade curtida.
Curtida até o fim
da capa amarela
em que se consome.
Transforma-se em fleuma
brisa cordiforme
em que não tropeço.
Antes, caminho
com vento nos cabelos.
E coração bailante
na música das rotas.

(04.11.2011)

sábado, 15 de outubro de 2011

Parafraseando Gil

Alma da gente por vezes
exige ser semente:
obriga a morrer pra germinar.

(15.10.2009)

domingo, 29 de maio de 2011

Poesia

"Eu perdi minha mãe muito cedo. E hoje, que sou mãe de uma filha, percebo que ela me chama do mesmo jeito que eu chamava a minha mãe.
Ouço ela me chamando e lembro de como eu era quando falava com a minha mãe.
É um chamado comprido, assim, 'mãaaaaaaaeeee'... como se estivesse contando uma história."

(28.05.2010)

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Gaiola

Te dão as barras,
o aço,
a fechadura
e você constrói a gaiola.
Vive ali por anos a fio
até que um dia,
por desencargo ou lembrança,
te oferecem a chave.
Você a observa,
examina,
quer tocá-la
mas não sabe mais como usá-la.
Sabe que não é mais possível usá-la.
Devolve-a com o olhar
dispensando a chance do voo.
Mas ainda assim
passa seus dias e noites
garantindo a si mesma
que ainda vive e ama
a lembrança do espaço aberto.

(06.05.2011)

terça-feira, 12 de abril de 2011

Vitral



Dessa igreja
de bancos escuros
e paredes brancas
desconheço
tantos dados
e datas
e histórias
e ações
que estudiosos
e devotos
e senhoras
e pastores
compartilham.

Nessa igreja
de paredes brancas
e luz solar
onde não entro,
onde habito
em velho olhar
e só vou
para buscar
velhas lembranças,

Nesta igreja
poucos olhos
me reconhecem;

Mas entre as cores
vítreas de luz
estão guardados
certos abraços
vozes antigas
passos mundanos
e visões de mim
que minha alma
trancafia
como essência
em minhas veias.

(12.04.2011)

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

De mim

Há lugares nos quais só estive uma vez.
Nunca ali morei, nunca os frequentei.
Mas deles guardo até hoje
uma saudade doída,
cálida,
como se de mim fizessem parte.
Vai ver, por isso:
semidesconhecidos,
são costurados
com pedaços de sonho.
E ao lembrá-los,
de mim mesma
é que me pego sentindo saudades.

(11.01.2011)

Ingenuidade

A boniteza das coisas
não se vence fácil.

(11.01.2011)

sábado, 1 de janeiro de 2011

Graças


"Acho que tudo que fiz é válido, senão não teria feito." (Neil Young)

Obrigada, Mãe Yemanjá, pela capacidade de banhar em amor.
Obrigada, Mãe Athena, pela bravura e sabedoria do sempre resistir em essência.
Pai Oxaguiã, fortaleça o equilíbrio da guerreira que mora em mim.
Obrigada, Pai Ogum, por abrir os caminhos.
Obrigada, Saturno, por me dar pernas e joelhos fortes para trilhá-los.
Obrigada Beiji, pela capacidade de sorrir com as coisas simples quando nada mais parece restar.
Obrigada meu Anjo da Guarda, por me guiar pelas bênçãos que eu mesma possa não pressentir.

Mãe Oxum, com sua alma doce, limpe minha alma neste novo ano.
Mercúrio, meu Esposo, me leve em vôo alto e belo em suas asas.

Obrigada a todas as mulheres da minha vida, mães, familiares e ancestrais, cuja força e comunhão senti de forma tão especial nesta noite de virada de ciclo, me fazendo crer novamente no quanto estamos todas vivas, unidas, fortes e prontas.
Que a Senhora que brilha no céu nos continue a ensinar a arte de renascer sempre a cada giro da vida.

A todos e todas, meu infinito e eterno Amor.

Graças dou por esta vida, pelo bem que revelou,
Graças dou pelo futuro, e por tudo que passou.
Pelas bênçãos derramadas, pela dor, pela aflição,
Pelas graças reveladas, graças dou pelo Perdão.

Graças pelo azul celeste e por nuvens que há também,
Pelas rosas no caminho e os espinhos que elas têm,
Pela escuridão da noite, pela estrela que brilhou,
Pela prece respondida e a esperança que falhou.

Pela cruz e o sofrimento e pela Ressureição,
Pelo amor que é sem medida, pela paz no coração.
Pela lágrima vertida e o consolo que é sem par,
Pelo dom da eterna vida, sempre Graças hei de dar.

(Hinário Luterano - comp. August Ludvig Storm)

(01.01.2011)